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DECLARAÇÃO PÚBLICA COMPROMISSO COLETIVO PELA DEMOCRACIA BRASIL: DITADURA NUNCA MAIS

- 01/04/2014
“Ah! Se conhecesses também tu, ainda hoje, o que serve para a paz” (Lc 19.42)

Há 50 anos, o presidente João Goulart foi deposto e instaurou-se uma ditadura no Brasil que durou 21
anos. Ao longo deste período, movimentos estudantis, de trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade, intelectuais e grupos religiosos lutaram arduamente pela democracia. Muitos foram assassinados, torturados, exilados e “desaparecidos”. São páginas ainda pouco esclarecidas de nossa história recente. O aprofundamento do direito à memória e à verdade é condição para a edificação da sociedade, pois garante que pessoas que sofreram violência por parte de agentes de Estado sejam reconhecidas como vítimas e suas histórias sejam resgatadas. Grupos ligados às Igrejas, em conjunto com muitos movimentos da sociedade, foram imprescindíveis para a superação deste período. Ressalta-se a mobilização para a denúncia e registro dos crimes de tortura que resultou no Projeto Brasil: Nunca Mais, protagonizado pelo movimento ecumênico com o apoio do Conselho Mundial de Igrejas. O acervo foi recentemente repatriado e contribuirá para elucidar fatos e histórias esquecidas.

Apesar de todo o aparato político, econômico e religioso da ditadura que gerou repressões, censuras,
prisões, assassinatos, exílios políticos e sofrimentos foram dados passos significativos em direção à abertura democrática. Conquistamos parcialmente a Anistia, inundamos as praças nas Diretas Já. O processo constituinte foi iniciado, possibilitando que questões antigas fossem colocadas em debate como a Reforma Agrária, os direitos sociais, os direitos humanos, a soberania nacional com a necessidade de uma auditoria da dívida externa e a ideia do controle social do Estado.

Os fatos por si confirmam que nossa democracia é limitada e inconclusa. A Reforma Agrária não foi
realizada de forma plena e efetiva, o fosso entre ricos e pobres é uma realidade em ascensão, assistimos a
vertiginoso enfraquecimento e criminalização dos movimentos sociais. Apesar de políticas públicas
importantes como a garantia de saúde e educação para todos, das políticas de cotas e das compensatórias, entre outras, todavia percebe-se um hiato grande quando estão colocadas na pauta questões para a melhoria do bemcomum e as de interesse de grandes grupos econômicos. Os interesses populares são relativizados quando os interesses de grandes grupos econômicos entram em cena.
As ameaças à democracia são constantes. Na América Latina, lembramos a deposição de presidentes
democraticamente eleitos, como no Paraguai e em Honduras. Recentemente, novas tentativas de deposição de líderes eleitos pelo povo têm acontecido em países vizinhos. Nossas Igrejas e organismos ecumênicos têm um compromisso histórico com a democracia.

Por isso, reafirmamos o nosso compromisso com os movimentos sociais que permanecem firmes no ideal
de uma sociedade com justiça que respeite e garanta os direitos humanos, culturais, sociais, econômicos e
ambientais. A luta por estes direitos demonstra a nossa opção preferencial pelas pessoas mais vulneráveis de nossa sociedade. Por isso, nos sentimos desafiados a nos pronunciar sobre o atual momento pelo qual passa nosso país.

Os limites e esgotamento do atual modelo de democracia representativa se revelam na privatização das
decisões do Congresso com a crescente subordinação do interesse público aos interesses privados das
empresas e organizações do poder econômico. O afastamento dos representantes eleitos das demandas da sociedade é resultado da natureza do sistema político, cujo processo eleitoral depende dos recursos financeiros privados e do lobby do poder econômico. Juntam-se a isso as iniciativas que pretendem formalizar a criminalização dos movimentos sociais.

Preocupa-nos o fato de que representantes do poder legislativo tentem introduzir em nossa legislação, através do PLS 499/2012, o chamado “AI 5 da Democracia”, a concepção de “crimes de terrorismo”. Sabe-se que a intenção é coibir a livre manifestação popular.
É inquietante a falta de conhecimento dos processos históricos da América Latina. Grupos se organizam
através das redes sociais para reivindicar o retorno a regimes autoritários e de exceção. Isso revela a
permanência de uma cultura punitiva e de violência como forma de resolução dos problemas sociais. Esta
cultura, em parte, é herança dos anos de ditadura. Outros obstáculos impedem o aprofundamento da democracia, entre eles, o não cumprimento de Convenções e Acordos internacionais firmados pelo país, como por exemplo, a Convenção 169 da OIT.

Grandes empreendimentos como os da Copa do Mundo não obedecem aos critérios de diálogo e respeito às populações afetadas. Ao contrário, privilegiam o lucro de grandes empresas, atropelando o direito à existência em especial das populações tradicionais.
Diante deste contexto, como Igrejas e organizações que acreditam que a democracia significa uma
sociedade que garanta direitos e oportunidade a todas as pessoas afirmamos nosso compromisso com:
Uma Reforma do sistema político, com vistas a garantir que os processos decisórios não se deem apenas
pela via eleitoral, pois o exercício do poder deve estar alicerçado na soberania popular como prática cotidiana de tomada de decisões. Não aceitamos que o poder econômico defina os resultados das eleições.
Repudiamos a sub-representação de vários grupos nos espaços de poder. Motivo pelo qual, nos somamos às estratégias construídas pela sociedade civil organizada, a exemplo da Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas e do Plebiscito Popular pela convocação de uma Constituinte exclusiva e soberana do sistema político.
Sublinhamos a necessária separação entre Estado e Religião prevista na Constituição Brasileira, sem
desconhecer como é importante a cooperação entre Estado e Religião com vistas ao bem comum. Repudiamos quaisquer instrumentalizações entre religião e política para fundamentar a discriminação e incitar a violência.

Neste tempo em que cristãos e cristãs celebram a quaresma, período de profunda reflexão sobre as
consequências da ruptura com a aliança entre Deus e sua criação, estejamos atentos e vigilantes.

Reafirmamos o nosso compromisso com o aprofundamento da democracia plena. O processo eleitoral
deste ano deve ser permeado por estas questões centrais que garantam a qualidade da democracia em nosso país.

CONIC, CESE, CLAI e INESC

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