de laboratórios e cozinhas

Hoje, quero repartir uma experiência didática com vocês. Ontem, na aula de Bioquímica do curso de Biologia do IPA, resolvi dar uma inovada. Já que ainda estávamos falando em pH, tampões, etc., resolvi demonstrar o efeito do ácido acético comercial (leia-se vinagre) sobre o leite (leia-se leite mesmo), fazendo uma interessante ricota em laboratório...

Em solução, quando as moléculas de uma proteína estiverem carregadas positivamente ou negativamente, a solubilidade dessa proteína será maior, aumentando a interação com a água. Existe um pH intermediário, que varia de proteína para proteína (pois depende dos radicais R variáveis dos aminoácidos que a constituem), em que há um equilíbrio entre as cargas positivas e negativas. Este pH é conhecido como PONTO ISOELÉTRICO da proteína – pI. Nesse pH, a proteína apresenta solubilidade mínima, porque a carga efetiva da molécula é nula (há um balanço entre cargas positivas e negativas). Se a solubilidade é nula, ela irá precipitar. Como a proteína do leite, a caseína, coagula em pH 4,6 - segundo os livros de bioquímica - , quando acidificamos com vinagre (bem forte) chegamos a esse pH, e, com uma ajudinha de um bico de Bunsen, facilitamos a tal coagulação ou precipitação da massa protéica do leite, bem em seu ponto isoelétrico. Simples, não? 

Em seguida, levei uma prova aos colegas da sala de professores, e o colega Garin aprovou! Aliás, as alunas da segunda turma de prática também ficaram bastante entusiasmadas com o peculiar experimento. Sempre digo que laboratórios e cozinhas são estruturas irmãs. Ao cozinhar, temos que ter a reverência de quem adentra um laboratório, um local de transformação, onde o ingrediente bruto se faz sabor. De semelhante modo, o laboratório deve ser tão íntimo a quem pesquisa ou a quem ensina quanto a cozinha de sua casa, ou da casa paterna/materna. Deve ter aquele não -sei-o-que de aconchego, de acolhida, de local sagrado e carinhoso, onde o empírico se faz saber.

Usar um experimento similar a este em aula é algo importante, já que formamos docentes, que não sabemos onde irão parar. Seguido encontramos nossos ex-alunos e alunas entusiasmados com seu trabalho nas prefeituras, escolas privadas, etc. No entanto, é importante instrumentalizá-los, para poder transformar em ciência o cotidiano e explicar a ciência por trás do cotidiano. Experimentos alternativos, factíveis em sala de aula com a meninada das escolas rurais, de periferia, etc., são essenciais à prática didática, sem dúvida. É o diferencial entre o puro tecnicismo e o freireano ato de educar de verdade, transformando educador e educando/a/s.

Comentários

  1. Guto, sempre considerei o bom cozinheiro um alquimista frustrado, e o alquimista um cozinheiro arrogante! rsrsrs
    Abração
    Nilkima
    http://incubandoideias.blogspot.com

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  2. é por aí, Nikima!! As duas coisas se encontram no sumidouro do espelho, diria o mestre Aldir Blanc...
    Um abração,

    Guto

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