Vale Tudo (menos a verdade e o bom gosto)

Confesso. Sim, eu vi. Vi aquele pastiche de filme sobre o Tim Maia, que a Grobio passou na semana passada, nas noites de 01 e 02 de janeiro. E quer saber? Eles levaram a sério uma das composições de Dom Maia, "Vale Tudo". Vale cortar pedaço de filme, vale transformar o Síndico num marginal e RC num ícone da bondade, vale realmente tudo!

Realmente, a Vênus Platinada sapateou na tumba do Síndico. O queridinho deles, o rapaz aquele que ninguém viu de bermuda, posando de santo e de benfeitor é pra matar. Para a inteligentzia global, um negro, gordo, pobre e com hábitos farmacologicamente desaconselháveis, é algo execrável à “estética” deles. Sacar da mini-série a cena do filme onde RC dá botas surradas e notas amarrotadas ao humilhado Tim foi muito descaramento, no sentido de preservar a "imagem" e a "santidade" do rapaz de Cachoeiro. Como se a visão transmitida no programete não fora humilhante o suficiente...

Pior de tudo foi pro Nelson Mota. O parceiro de Dori Caymmi rasgou seu próprio livro ao bancar marionete na seriezinha furreca. Não posicionou-se, até onde tenho notícia, sobre o descarado corte na montagem televisiva, fazendo ainda comentários bastante cínicos sobre Tim. Amigão Sempre!

Felizmente, há bons espaços para a troca de ideias com senso crítico… O professor Juremir Machado fomentou uma interessante discussão sobre o tema em seu blogue (http://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/?p=6827#comment-37933). Nota dez, professor!!!

Roberto Carlos é a cara da Globo. É a imagem de uma sociedade conservadora, que fala em família antes de cair na esbórnia. Tim Maia, mulato, obeso, um junkie total, rebelde, dentro da lógica marinheira, jamais poderia estrelar um especial de Natal, naqueles moldes bregas e pastichentos que a Globo estabelece (em que pese tenha feito uma participação num deles....). Dentro da lógica da emissora que ajudou a eleger o presidente boa pinta que roubou as poupanças de muita gente boa, a imagem é superior ao talento. E nem dá para comparar Tim Maia com Roberto Carlos, exceto para expor a genialidade do primeiro e a limitação do segundo. Roberto Carlos tem uma voz limitada, anasalada, sem força e empatia. Suas composições, salvo pérolas mais antigas, são de qualidade duvidosa. Ou melhor, não é duvidosa, é ruim pra cacete mesmo! Brega, melodramático, chato, tirando algumas geniais pérolas, que ganharam força em vozes de verdade, como Elis Regina. "As curvas da estrada de Santos" surpreende na voz da Pimentinha. "Força Estranha", outra que vale ouvir, é do Caetano, não dele, e é magistralmente cantada pela Gal com o violão de Robertinho do Recife. "Debaixo dos caracóis" eu curto, uma bela canção de exílio, confirmando que toda regra tem sua exceção.

Mas a Globo gosta de RC, e não gosta do Tim, não é comercializável, como os sertanojos e pagonejos da vida. Isso eles gostam, o que é bom e crítico, necas. Vai contra o gosto do "pai de família" que bate no peito para falar mal dos outros, usar a palavra "comunista" como ofensa, mas que trama vida dupla, curte isso. Eca!


Voltando a Dom Maia, ele foi grande, sem trocadilhos. Tim é um dos grandes ícones da música neste país, trouxe toda a informação da Motown, da cena soul americana, o rock quase marginal dos EUA, para uma MPB cujas informações do pop mundial passavam longe dessa vertente artística. A própria fase Racional do Tim foi muito mal retratada na meleca global, e olha que é uma das mais geniais da sua carreira! Preferiram tratá-lo como um fanático tosco a mostrar as pérolas do disco Tim Maia Racional 1 e 2.

Enfim, mais uma vez, o que há de bom neste país é transformado em uma massa amorfa e esquisita pelos ditadores do padrão curturar brasileiro. Felizmente, o acervo de Tim está por aí, para ser acessado, ouvido e curtido. RC, já não recomendo muito...a menos que o programa seja cortar os pulsos depois, com bolacha Maria molhada no leite morno!

Aos fãs do carinha capixaba, este curtidor de MPBdaB recomenda duas coisas: estudem Música ou limpem os ouvidos!

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